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Políticos na berlinda

Para alguns um marco na fiscalização do poder público. Para outros, uma ação que chegou ao abuso de autoridade. O fato é que a Operação Lava Jato, de caráter nacional, e a Pecúlio, deflagrada em Foz do Iguaçu, levou políticos, servidores públicos e empresários para a cadeia, inaugurando uma prática pouco comum no Brasil. Em Foz do Iguaçu, a ação desbaratou um esquema de corrupção na prefeitura que consumiu dinheiro de obras, impostos e da saúde pública. Nesta entrevista ao Front Press, o promotor de Justiça Luis Marcelo Mafra faz uma análise das ações e reitera a postura de inaptidão para a gestão pública e má intenção que são bastante comuns entre os governantes.

Tendo em vista as operações Lava Jato e Pecúlio, o que podemos afirmar? O Ministério Público começou realmente a fazer o papel que lhe cabe ou os políticos estão ousados a ponto de facilitar a identificação da corrupção?

Na leitura que faço, a cultura da impunidade é algo que sempre esteve muito enraizada na política brasileira. Não só na política e também na administração pública. E com essas grandes operações deflagradas tanto a nível local, regional e nacional, e partir do momento em que políticos de grande expressão começaram a ser atingidos pela ação do Ministério Público, é evidente que isso causou e vem causando um grande temor por parte da classe política. De outro lado, tem havido apoio forte e consistente tanto por parte da mídia, quanto da opinião pública. No fundo, todos os brasileiros estavam ávidos para ver algo realmente relevante e de grande envergadura acontecendo no combate à corrupção. Acredito que nós temos vivenciado um grande avanço e para mim isso é só o início.

Então daqui para frente a tendência é manter esse padrão de fiscalização?

O grande sucesso da Operação Lava Jato é que ela não foi construída a partir de um trabalho desenvolvido exclusivamente pela Polícia Federal, mas por um conjunto de órgãos, Receita Federal, Coaf e esse respaldo do Poder Judiciário. Nós temos notado que das decisões proferidas em primeiro grau, a maioria tem sido confirmada pelas instâncias superiores. Isso fortalece a figura do juiz que está na base.

O senhor acha que após a Operação Pecúlio os políticos de Foz do Iguaçu vão pensar mais antes de promover alguma ação relacionada à corrupção?

Eu diria que a Operação Pecúlio já serviu como divisor de águas. Isso colaborou para uma decantação do processo de representação política. Nós experimentamos uma mudança bastante expressiva na composição da próxima legislatura da Câmara Municipal e realmente torcemos para que esses fatos não voltem a ocorrer. De fato, a experiência vivenciada nesses últimos anos tem demonstrado desmonte total na administração municipal.

Isso gera prejuízos imensos à população.

Prejuízos incalculáveis. Eu tenho acompanhado todos os problemas na saúde pública e posso dizer que nunca vi nada parecido nos 21 anos que atuo no Ministério Público. Ainda é prematuro falar em valores, mas os prejuízos são muito elevados e eu diria até incalculáveis.

Além dos prejuízos morais.

Sem dúvida, nós tivemos interdição de unidades de saúde da rede municipal por falta de recolhimento do lixo. Ou seja, é algo elementar no funcionamento da unidade e estamos enfrentando esse tipo de problema.

O senhor acha que o político não teme ser punido devido à tamanha ousadia de praticar a corrupção?

Como eu disse, há essa cultura da impunidade e de fato creio que não havia esse temor por parte da classe política. Agora há esse temor. Temos acompanhado alguns movimentos, sobretudo em Brasília, para tentar impedir ou embaraçar a atuação de órgãos como o Ministério Público e o Poder Judiciário. Lei de abuso de autoridade, crimes de responsabilidade, enfim, para um bom entendedor meia palavra basta.

Percebemos que o Ministério Público fez um trabalho regional com casos em Itaipulândia e outras cidades. Mudou alguma coisa?

Eu diria que o que mudou foram os mecanismos de controle. Há mecanismos mais eficientes, um trabalho mais sincronizado, atento, e a cooperação entre os órgãos facilita nosso trabalho.

No que o político mais erra? Qual é o erro crasso que facilita a identificação do crime?

São muitos equívocos, mas há algumas práticas recorrentes, por exemplo, permitir que um contrato do ente público chegue a seu fim sem um prévio planejamento da renovação, sem uma nova licitação. E a partir daí produzir uma emergência apta a justificar uma dispensa de licitação. E aí se pode direcionar para A ou B aquele determinado contrato com valores muitas vezes superfaturados.

Existem regras a serem cumpridas, mas os políticos conseguem burlar. As regras são frágeis ou o mecanismo de burlar é mais forte?

A criatividade do ser humano é infinita. Mas com essas práticas que vieram à tona, dificilmente eles conseguirão repeti-las, até porque agora a vigilância está mais presente e eficaz.

Há dois caminhos, às vezes os políticos erram por crime de improbidade e há também aquele mal-intencionado.

O ineficiente e o ímprobo. Em alguns momentos nos deparamos com a conjunção desses dois defeitos. A ineficiência, incompetência, com a má-fé.

E qual é o mais comum?

Ambos, infelizmente.

O ineficiente às vezes reclama que os mecanismos acabam amarrando a máquina pública. Como o senhor vê isso?

Fundamentalmente o administrador público tem que trabalhar com planejamento. Se houver um planejamento, como a gente faz na própria família, de despesa, de investimento, enfim, de todos os gastos e ações que se pretende implementar, não vejo grandes problemas.

Então isso é má administração.

Sim, muitas vezes você ter interesses e pressões corporativas, isso pode produzir efeitos terríveis, impactados. Tivemos casos de projetos de lei com parecer contrário na parte técnica que foram sancionados. Isso é muito preocupante.

Para o próximo ano podem esperar uma ação semelhante do Ministério Público?

O próximo administrador que fique de olhos bem abertos. Nós estamos na área.