Em 2006, as autoridades brasileiras alcançaram uma importante vitória contra o contrabando em Foz do Iguaçu. A inauguração da Nova Aduana, em agosto daquele ano, representou um baque para os sacoleiros, que levavam mercadorias clandestinas, a pé e utilizando carros e ônibus através da Ponte Internacional da Amizade. Com 8,4 mil metros quadrados, a estrutura permitiu investigar com maior rigor os pedestres e os veículos. Tornou-se possível fiscalizar 5% das cerca de 50 mil pessoas e dos 15 mil veículos que atravessavam a ponte, que leva do Paraguai para o Brasil. A amostragem se mostrou suficiente para desestimular o crime.
Mas o contrabando reagiu rápido. Em poucas semanas, abandonou os ônibus e deixou de contratar pessoas para passar o dia indo e vindo pela ponte, com sacolas enormes de produtos contrabandeados sobre a cabeça. Desde então, a ação criminosa passou a ser distribuída por toda a extensão do rio Paraná e do lago de Itaipu. Resultado: um levantamento da Delegacia Especial de Polícia Marítima (Depom), da Polícia Federal (PF), indica que, a cada 500 metros das margens do lago, existe um ponto que permite que caminhões e caminhonetes estacionem perto da água.
Considerando que o lago tem um total de 1.350 quilômetros de margens, a Depom estima existem aproximadamente 3 mil pontos de desembarque de armas, drogas e produtos contrabandeados, que atravessam a fronteira pelo lago, utilizando pequenas embarcações que se conectam aos veículos. “Quando o barco pequeno do contrabandista é abordado pela polícia, ele é virado, para que os agentes não possam ficar com a carga”, afirma Luciano Barros, presidente do Instituto de Desenvolvimento Econômico e Social de Fronteiras (Idesf). “Quando a carga é formada por cigarro ou eletrônicos, o contrabando se perde. Mas, quando são agrotóxicos ilegais, eles contaminam a água”.
Uma área, em especial, é estratégica, principalmente para o tráfico de drogas: ela fica entre a hidrelétrica de Itaipu e o Marco das Três Fronteiras, no ponto onde Brasil, Paraguai e Argentina se encontram. Ali, a barranca do Rio Paraná se estende por 21 quilômetros. A área é tomada por pontos de desembarque de produtos ilegais.
Todas essas clareiras, picadas e trilhas dão aos contrabandistas a capacidade de agir rápido, e em locais diferentes. Quando identificados pelos agentes policiais, esses pontos podem ser rapidamente abandonados – basta derrubar algumas árvores e abrir outro ponto de acesso ao lago. “Muitas vezes, os agentes com os quais conversamos relatam que a sensação é de enxugar gelo”, diz Luciano Barros. “A apreensão de cargas bate recorde, e tem impacto na variação do preço dos produtos revendidos no Brasil, mas não chega a ameaçar a atividade dos contrabandistas.”
De fato, a apreensão vem batendo recordes. Além disso, nas últimas duas décadas, diferentes órgãos de fiscalização, incluindo a Receita Federal e as polícias federal, militar e rodoviária, melhoraram a integração e passaram a realizar ações conjuntas. E o Exército realiza constantemente ações em larga escala.
A ação mais recente foi uma nova edição da Operação Ágata, uma ação do exército que, desde 2011, atua em todos os pontos de fronteira do Brasil. Entre março e maio de 2019, o alvo foi a região Sul do país. Nessas ocasiões, o Exército leva para a região veículos blindados Guaranis, anfíbios, equipados com canhão e metralhadora e com autonomia de combustível de até 600 quilômetros. A operação contou com a parceria das polícias militar, civil, federal e rodoviária, além do corpo de bombeiros e agências fiscalizadoras estaduais e federais, como o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais (Ibama) e as receitas federal e estadual.
Ainda assim, para o monitoramento diário, o contingenciamento constante de recursos limita o número de profissionais dedicados à rotina de investigar o contrabando na região. A Polícia Federal não informa o total de pessoal dedicado à fiscalização da região, por questões estratégicas. É também o caso da Receita Federal, que explica, via assessoria de imprensa: “O número de servidores não é revelado por uma questão de estratégia institucional. Os servidores da Receita Federal que atuam diretamente na repressão ao contrabando e descaminho não estão localizados somente nas unidades de fronteira”.
A Receita Federal informa que, além das equipes nas unidades de fronteira como Foz do Iguaçu, Guaíra, Mundo Novo, Ponta Porã e Corumbá, possui equipes de repressão em lugares estratégicos por onde o contrabando pode ser escoado para o interior do país. O órgão também mantém dois helicópteros baseados em Curitiba, equipados com câmeras de longo alcance e visão noturna. Também se utiliza de veículos com tração quatro por quatro e lanchas nas unidades aduaneiras portuárias.
Mas o órgão aponta que a redução do orçamento atrapalha o trabalho: “A cada ano a falta de concursos públicos e as restrições orçamentárias impostas aos órgãos federais fazem com que as equipes venham ficando menores”.